DECRETO REGULAMENTA A UTILIZAÇÃO DE PRECATÓRIOS FEDERAIS PARA PAGAMENTO DE DÍVIDA ATIVA

Precatório é um “título de crédito executivo judicial”, decorrente da execução da sentença de um processo judicial, após o trânsito em julgado de ação que condenou Estado, União ou munícipio a determinado pagamento.

No final de 2021 o Congresso Nacional aprovou de diversos textos legais e constitucionais, sendo que uma das maiores alterações promovidas pelo poder legislativo consiste na promulgação da "PEC dos Precatórios" (PECs 23/2021 e 46/2021), que originaram as Emendas Constitucionais (ECs) nºs 113 e 114 de 2021.

Entre as novidades das emendas constitucionais é a redação do § 9º do art. 100 da Constituição Federal, que estabelece a possibilidade de compensação dos precatórios com débitos que se encontrem ajuizados pelas Fazendas Públicas.

Em resumo, a disposição legal estabelece que, no ato de quitação do precatório, a Fazenda Pública deve notificar o Tribunal competente acerca da existência de débitos inscritos em dívida ativa em nome do credor do requisitório. Essa notificação visa assegurar que o montante correspondente seja depositado nos autos da ação de cobrança destes débitos. Dessa forma, cabe ao magistrado responsável pela referida ação decidir acerca da possível compensação do valor depositado com o débito em discussão.

Outra inovação trazida que merece destaque é a ampliação da possibilidade de utilização de precatórios para diferentes finalidades.

Isso porque o art. 100, § 11º da Constituição Federal, em sua redação anterior às ECs 113 e 114, previa apenas a possibilidade de utilização de precatórios para a aquisição de imóveis públicos. Com a nova redação, o credor do precatório poderá quitar débitos parcelados ou inscritos em dívida ativa com o ente devedor, além de outras possibilidades estabelecidas no rol do dispositivo constitucional.

Portanto, atualmente, o credor de precatório – seja o originário ou por precatório adquirido de terceiro – poderá utilizá-lo na quitação de débitos parcelados ou inscritos em dívida ativa pela Fazenda Pública devedora.

Nesse contexto, destaca-se a redação do artigo 100, §11 da Constituição Federal, alterado pelas ECs 113 e 114:

Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. (...)
§ 11. É facultada ao credor, conforme estabelecido em lei do ente federativo devedor, com auto aplicabilidade para a União, a oferta de créditos líquidos e certos que originalmente lhe são próprios ou adquiridos de terceiros reconhecidos pelo ente federativo ou por decisão judicial transitada em julgado para: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)
I - quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa do ente federativo devedor, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com a administração autárquica e fundacional do mesmo ente; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)
II - compra de imóveis públicos de propriedade do mesmo ente disponibilizados para venda; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)
III - pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pelo mesmo ente; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)
IV - aquisição, inclusive minoritária, de participação societária, disponibilizada para venda, do respectivo ente federativo; ou (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)
V - compra de direitos, disponibilizados para cessão, do respectivo ente federativo, inclusive, no caso da União, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 113, de 2021)

No âmbito da União, a previsão contida no § 11º do art. 100 da Constituição Federal é autoaplicável, isto é, não depende de lei para ser pleiteada pelo credor, bastando apenas que o precatório já esteja expedido pelo Tribunal competente. Contudo, diante da especificidade quanto a auto aplicabilidade para a União, interpreta-se que o uso destes créditos para os outros entes federativos (Estados, Distrito Federal e Municípios) dependerá de regulamentação advinda de lei.

É oportuno mencionar que, embora o referido dispositivo estabeleça autoaplicabilidade para a União, a questão parece necessitar de regulamentação pela Procuradoria da Fazenda Nacional, a fim de que sejam estabelecidos os procedimentos para solicitação da referida compensação. Essa regulamentação ocorreu por meio do Decreto nº 11.249, de 09 de novembro de 2022.

 Assim, o Decreto nº 11.249/2022 dispõe sobre o procedimento de oferta de créditos líquidos e certos decorrentes de decisão judicial transitada em julgado.

No tocante aos termos do referido Decreto, os créditos ofertados podem ser próprios do interessado ou por ele adquiridos de terceiros, desde que reconhecidos pela União, suas autarquias e fundações públicas, por intermédio da Advocacia-Geral da União, decorrentes de decisões transitadas em julgado.

E, o seu art. 2º informa que a oferta destes créditos é faculdade do credor, que poderá utilizá-la, observados os procedimentos, para os seguintes fins:

I - quitação de débitos parcelados ou débitos inscritos em dívida ativa da União, inclusive em transação resolutiva de litígio, e, subsidiariamente, débitos com autarquias e fundações federais;
II - compra de imóveis públicos de propriedade da União disponibilizados para venda;
III - pagamento de outorga de delegações de serviços públicos e demais espécies de concessão negocial promovidas pela União;
IV - aquisição, inclusive minoritária, de participação societária da União disponibilizada para venda; e
V - compra de direitos da União disponibilizados para cessão, inclusive, da antecipação de valores a serem recebidos a título do excedente em óleo em contratos de partilha de petróleo.

Importante destacar que a oferta dos créditos não autoriza o levantamento, mesmo que parcial, de depósito existente vinculado aos ativos de que trata o inciso I do art. 2º.

Ainda, a utilização dos créditos obedecerá, aos requisitos procedimentais do ato normativo que reger a disponibilização para venda, outorga, concessão negocial, aquisição de participação societária ou compra de direitos estabelecida pelo órgão ou pela entidade responsável pela gestão, pela administração ou pela guarda do bem ou do direito que se pretende adquirir, amortizar ou liquidar.

Além disso, a fruição dos créditos será feita por encontro de contas e a administração pública federal direta, autárquica e fundacional deverá garantir a confiabilidade das informações demonstradas nos relatórios contábeis e fiscais apresentados pela União.

Ressalta-se também que para este procedimento (oferta dos créditos) há a necessidade de apresentação de requerimento do credor, acompanhado de documentação comprobatória ao órgão ou à entidade detentora do ativo que o credor pretende liquidar.

Segundo Rafael Furtado, secretário de Fomento, Planejamento e Parcerias do Ministério da Infraestrutura, “agora está mais simples para as empresas acessarem eventuais créditos que tenham com a União, mas que, na prática, ainda não estariam disponíveis”.

Por fim, vale frisar que, considerando a autoaplicabilidade prevista no texto constitucional, bem como o direito constitucional de petição (art. 5º, XXXIV, "a", da CF), eventual indeferimento de um pedido administrativo de compensação poderá ser suprido pelo Poder Judiciário, com a impetração de um mandado de segurança. A ausência de ato normativo regulamentando a compensação de precatórios não é fundamento para se negar um direito subjetivo autoaplicável previsto no texto constitucional.

 

Fonte: https://www.gov.br/infraestrutura/pt-br/assuntos/noticias/2022/11/decreto-regulamenta-uso-de-creditos-decorrentes-de-decisoes-judiciais-para-pagamento-de-outorgas-e-aquisicao-de-estatais

 

   Yngrid de Melo Costa Silva
• Advogada – Direito Tributário e Direito da Família e Sucessões
• Pós-graduanda em Direito da Família e Sucessões pela Academia Brasileira de Direito Constitucional (ABDCONST)
• Bacharela em Direito pela Universidade Positivo