INCLUSÃO/EXCLUSÃO DO IPI NÃO RECUPERÁVEL DA BASE DE CÁLCULO DOS CRÉDITOS DE PIS E COFINS

O Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) não recuperável corresponde à parcela do IPI recolhido pelo fabricante ou fornecedor, mas que não pode ser compensado pelo adquirente, uma vez que ele não é contribuinte do imposto.

Isso normalmente ocorre com comerciantes varejistas, que praticam a revenda a consumidor final. Nessas operações, o IPI que incide no momento da aquisição das mercadorias destinadas à revenda não pode ser recuperado, pois não há uma próxima etapa na qual ele possa ser usado para compensação. Ou seja, não ocorre uma nova transação/evento que gere o IPI. Como resultado, esses varejistas não são considerados contribuintes do imposto federal.

É importante ressaltar que na indústria, o que é pago em uma cadeia deve sofrer o abatimento do que foi cobrado na etapa anterior, pela lógica da não cumulatividade. No entanto, na atividade de revenda, não há um processo de fabricação ou industrialização, o que torna impossível a dedução do IPI.

Desse modo, em razão da impossibilidade de dedução, o IPI é tido como não recuperável na escrita fiscal do contribuinte, podendo ser incluído na base de cálculo dos créditos do Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

Diferentemente dos impostos recuperáveis, que incidem em etapas específicas da cadeia de comercialização de mercadorias e podem ser compensados na etapa seguinte, quando o comprador, que também é um contribuinte do imposto, realiza uma nova operação sujeita à tributação.

Ao longo dos anos, a Receita Federal do Brasil reconheceu expressamente o direito à inclusão do IPI não recuperável da base de cálculo dos créditos de PIS e Cofins, nos termos das Instruções Normativas SRF n° 247/2002 e n° 404/2004, e da Instrução Normativa RFB n° 1.911/2019.

Nesse mesmo sentido é a Solução de Consulta COSIT nº 579, publicada em 28.12.2017 pela Receita Federal, segundo a qual “o IPI não recuperável destacado pelos fornecedores nas notas fiscais de venda, integra o valor de aquisição de bens destinados a revenda para efeito de cálculo do crédito da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, na sistemática não cumulativa”.

Contudo, em dezembro de 2022, a Receita Federal alterou seu entendimento e editou uma nova Instrução Normativa (IN RFB nº 2.121/2022), que consolidou as normas relativas à apuração, cobrança, fiscalização e arrecadação do PIS e da COFINS, revogando inteiramente a IN RFB nº 1.911/2019.

Por meio do artigo 170, inciso II, da IN RFB nº 2.121/2022, a Receita Federal impôs aos contribuintes a obrigação de excluir do cálculo dos créditos de PIS e COFINS a parte do IPI "incidente na venda do bem pelo fornecedor".

Como resultado, a partir de 2023, os contribuintes deixaram de ser beneficiados pelo creditamento de PIS e Cofins decorrentes do IPI não recuperável, suportado nas aquisições para revenda.

Vale destacar que em julho de 2023, a Receita Federal publicou uma nova Instrução Normativa (IN RFB nº 2.152/2023), que, embora tenha revogado o artigo 170, inciso II, da IN RFB nº 2.121/2022, modificou a redação do artigo 171 da mesma Instrução Normativa. Essa mudança manteve a restrição ao direito de aproveitamento de créditos referentes ao IPI incidente na venda pelo fornecedor.

Diante desse cenário, nos últimos meses uma nova tese tributária vem ganhando força no Poder Judiciário. A tese defende a manutenção ao direito ao crédito de PIS e Cofins sobre o montante do IPI não recuperável, tendo em vista que não houve alteração da legislação federal envolvendo o PIS e a Cofins.

Isso porque, de acordo com a legislação referente ao PIS e à Cofins, especialmente as Leis nºs 10.637/02 e 10.833/03, em conjunto com os Decretos n° 4.524/2002 (PIS/Cofins) e nº 9.580/2018 (Regulamento do Imposto sobre a Renda – RIR), o imposto, quando não recuperável, compõe o custo de aquisição do contribuinte. 

Nesse contexto, é importante esclarecer que o termo "custo de aquisição" abrange todos os gastos relacionados à compra de um bem ou insumo, com a exceção óbvia dos tributos que podem ser recuperados. Isso significa que, ao calcular o custo de aquisição de um item, todos os custos diretos e indiretos associados à sua aquisição devem ser considerados, exceto os impostos que podem ser reembolsados ou recuperados.

De acordo com a hierarquia das normas no Brasil, em situações em que há um conflito entre o que está estabelecido na lei e o que é regulamentado por atos administrativos, como instruções normativas, é a lei que deve prevalecer como orientação para as ações da Administração Pública.

Em outras palavras, se não existe uma lei determinando a exclusão do IPI não recuperável da base de cálculo dos créditos de PIS e COFINS, não pode a Fazenda Pública, por meio de instrução normativa, exigir dos contribuintes essa exclusão.

Não bastasse isso, tanto a Constituição Federal quanto o Código Tributário Nacional estipulam que somente uma lei em sentido estrito é capaz de estabelecer direitos e obrigações, bem como estabelecer a instituição e a majoração de tributos.

E é evidente que a inovação trazida pela IN RFB nº 2.121/22 resultou em majoração, mesmo que de forma indireta, da carga tributária do PIS e da COFINS, uma vez que a mencionada Instrução Normativa retira o IPI não recuperável do cálculo do crédito do PIS e da COFINS nas aquisições de bens destinados à revenda.

Diante dessa situação, uma rede de supermercados paulista moveu ação judicial, cuja sentença foi recentemente proferida pela juíza Daniela Paulovich de Lima, da 1ª Vara Federal de Piracicaba. Na decisão, foi declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade da regra estabelecida na IN nº 2.121/2022, mantendo o IPI não recuperável incidente sobre aquisições de produtos destinados à revenda na base de cálculo dos créditos de PIS/Cofins.

A magistrada explicou que o IPI não recuperável pode ser creditado, tendo em vista que ele faz parte do valor das aquisições de bens para o cálculo do crédito da Contribuição para o PIS/Cofins na sistemática não cumulativa.

Portanto, considerando que a IN nº 2121/2022 passou a vetar a tomada de créditos de PIS e Cofins sobre a parcela não recuperável do IPI, as empresas varejistas devem se atentar para o procedimento a ser adotado.

Além disso, é recomendável a impetração de mandado de segurança com o objetivo de autorizar a inclusão do IPI não recuperável na base de cálculo dos créditos de PIS e Cofins. Adicionalmente, pode ser pertinente buscar o creditamento dos valores que foram excluídos com a edição da Instrução Normativa.

 

 

  Julia Domingos Trojan
• Advogada – Direito Tributário
• Pós-graduanda em Gestão Tributária pela Universidade de São Paulo (USP)
• Especialista em Direito Público: Constitucional, Administrativo e Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS)
• Bacharela em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR)